Um grupo de cerca de 20 policiais cobra da campanha de Pablo Marçal (PRTB) o pagamento por serviços prestados como seguranças e motoristas e calculam a dívida entre R$ 150 mil e R$ 200 mil.
Eles cogitam entrar com ação na Justiça do Trabalho contra o influenciador, apesar de a realização de bico fora do horário de trabalho não ser autorizada pela corporação, ainda que seja uma prática comum.
Outras duas empresas também afirmam terem sofrido calote da campanha de Marçal.
Segundo integrantes do grupo, desde que o candidato perdeu a eleição para a Prefeitura de São Paulo no primeiro turno, há um jogo de empurra entre o PRTB e integrantes da campanha a respeito da responsabilidade sobre o pagamento.
Quando começaram a prestar serviço para Marçal durante a campanha e pré-campanha, entre julho e agosto, os policiais afirmam que chegaram a receber pagamento por meio de Pix feito pelo próprio influenciador. Na prestação de contas enviada à Justiça Eleitoral, porém, Marçal não declarou ter investido recursos próprios na campanha.
Posteriormente, os pagamentos passaram a ser feitos pela empresa Hipersapiens – Treinamentos e Soluções em Saúde, também via Pix. A campanha de Marçal declarou ter transferido para essa empresa R$ 347,7 mil (R$ 191,7 mil em 3 de outubro e R$ 156 mil em 16 de agosto).
No DivulgaCand (sistema da Justiça Eleitoral), a empresa aparece com o nome Hipersapiens – Segurança, Treinamentos e Facilities.
Trata-se do terceiro maior gasto da campanha, num total de R$ 6 milhões em despesas declaradas até agora. Marçal arrecadou R$ 8 milhões em doações e afirmou que não usaria dinheiro próprio ou do partido. Em debates e entrevistas, reforçou ser o único candidato que não usaria verba pública para bancar a campanha.
Os serviços de segurança prestados em setembro, que deveriam ter sido pagos no início de outubro, segundo os policiais, não foram remunerados após a derrota de Marçal.
Dois policiais militares ouvidos pela reportagem afirmam que atuavam em seus dias de folga como seguranças de Marçal, da vice Antônia de Jesus e de um dos coordenadores da campanha, Wilson Pedroso.
Procurada pela Folha, a assessoria de Marçal afirmou que os seguranças que prestaram serviço diretamente ao influenciador “estão com seus pagamentos em dia”.
“Havia uma equipe de segurança que estava a cargo do PRTB e que atendia a vice-prefeita e outras pessoas do partido. Se existe alguma pendência, cabe ao partido realizar os pagamentos referentes a essa equipe específica”, completa.
O presidente do PRTB, Leonardo Avalanche, não respondeu até a publicação da reportagem.
A Folha teve acesso a mensagens do grupo de WhatsApp por meio do qual eram escalados a cada dia, mas eles admitem que não houve contrato, apenas um acordo verbal.
Ainda de acordo com os policiais, o valor pago pela diária, que começava às 7h30, era de R$ 350 e, caso não fossem liberados até as 23h, o valor dobrava para R$ 700. Dois deles afirmam ter cerca de R$ 13 mil a receber e, em um dos casos, mais R$ 2.000 em reembolsos de estacionamento, alimentação e combustível.
A reportagem teve acesso a dois comprovantes de transferência Pix de Marçal para os dois policiais, em valores inferiores a R$ 200 para reembolso de despesas com alimentação.
Os policiais afirmam ainda que foram recrutados por um outro policial que já prestava serviços de segurança para Marçal —Leandro Cruz, que concorreu a vereador pelo PRTB. De acordo com eles, Cruz não tem respondido às cobranças de pagamento. A reportagem não conseguiu contato com ele.
Como mostrou a Folha, Cruz foi um dos aliados que acompanhou o influenciador em viagem a El Salvador para supostamente encontrar o presidente Nayib Bukele, o que não ocorreu. Durante a viagem, Cruz e outros integrantes da comitiva apareceram em fotos publicadas nas redes sociais surfando, tomando banho de piscina em frente ao mar e usando a academia do hotel Real Intercontinental San Salvador, onde ficaram hospedados.
Os policiais ouvidos pela reportagem dizem acreditar que serão vítimas de um calote. Um deles afirma que deixou de prestar serviço para a Operação Delegada, na qual podem fazer um tipo de bico oficial, para atender a campanha e agora acumula dívidas. A promessa era a de que integrariam a assessoria da PM na prefeitura caso Marçal fosse eleito.
Para os seguranças, Marçal deveria arcar com a despesa do próprio bolso e, depois, cobrar ressarcimento do partido.
Os demais casos em que empresas afirmam terem sofrido calote foram revelados pelo portal Metrópoles e confirmado pela reportagem da Folha.
Uma delas, a Vivere Press Comunicação 360 entrou com uma ação na Justiça estadual cobrando o pagamento. O contrato para atuar nas áreas de assessoria de imprensa e marketing estabelecia o pagamento no valor total de R$ 625 mil em três parcelas.
A outra empresa que acusa o influenciador de não pagar pelos serviços prestados é a Qualimedia. O advogado da empresa, Filipi Gerhardt, diz que a firma foi contratada antes de começar a campanha para prestar serviço de mídias.
Marçal já foi alvo de uma operação da Polícia Federal, em julho do ano passado, sob suspeita de falsidade ideológica, lavagem de dinheiro e apropriação indébita nas eleições de 2022, quando foi pré-candidato à Presidência da República e candidato a deputado federal, mas acabou tendo o registro indeferido pela Justiça Eleitoral.
Segundo a apuração da PF, Marçal e um sócio dele fizeram doações à campanha do influenciador e parte desses valores foi remetida às próprias empresas das quais são sócios por meio do aluguel de veículos e aeronaves.
Marçal afirma que não praticou ilícito e que a campanha não foi paga com dinheiro público, mas com doações e recursos próprios.